Foi quando meu pai me levou à estação antiga, rumo ao colégio interno, que ele disse: "Filho, tome muito cuidado, aquele lugar
é uma selva, não seja mais uma presa!" Essa frase me impressionou, criou uma atmosfera de medo e fascínio em minha mente, passei a fantasiar aquela "selva", meus pensamentos se limitavam a isso.
Chegando na cidade, meu peito palpitava rapidamente, aquele frenesi borbulhava até minha garganta, medo, curiosidade, ansiedade, palavras que definem meus sentimentos. Entrei em meu quarto, me deparei com uma figura enigmática, bela, hipnótica, era meu colega de quarto, ele nunca me disse seu real nome, ele chamava a si próprio de Diabo. O rapaz devia der uns 17 anos, era pálido, alto, cabelos e olhos negros como a noite, tinha um sorriso falso e cínico que lhe passava um ar de desprezo e perversão, ele falava-me teorias insanas cruéis, venenosas, mas ao mesmo tempo fascinantes, as palavras saiam-lhe como notas de um violino que cheias de veneno se transformavam em serpente, a serpente me hipnotizava, suprimia minha vontade, e eu permitia que ela me mordesse, a dor do veneno me penetrava, me causava prazer, consumia minhas entranhas, exalava-se através dos meu poros. Maldita e bendita seja a cobra!
Passamos a quase não dormir a noite, ninguém sabia, ninguém ouvia, os gritos eram abafados pelo travesseiro. Começamos a trazer novos garotos, e com eles novas experiências, cada um tinha uma personalidade, eu era a lebre, outro a raposa, outro um cão, entretanto, no fim das contas todos eram mordidos pela cobra. Maldita e bendita seja a cobra!
Eu costumava ser o primeiro a dormir e no outro dia estava somente o Diabo no quarto, lendo seus livro do Marquês de Sade, os garotos, dizia ele, voltaram para selva. Palavras que me intrigavam bastante, pois depois de tudo, os garotos simplesmente despareciam, sumiam completamente, não deixando nenhum rastro na escola.
O número de rapazes diminuiu consideravelmente no colégio, até mesmo alguns professores foram mordidos pela cobra, e assim como os outros eles desapareciam, criando assim, uma atmosfera de pânico em todos, o mistério corria nas mentes das pessoas, somente eu desconfiava sobre o que realmente estava acontecendo.
Perguntei então ao Diabo, o por quê dos sumiços, e ele respondia que eles apenas voltaram para a selva!
Por que eu também não voltava para a selva?! Ele me respondia que entre nós não havia predação, nossa relação era mútua e obrigatória, seria impossível vivermos separados.
No auge da minha desesperada curiosidade, deixei de dormir em uma das noites de volúpia, para meu espanto vi a cobra comendo, e no sangue ela se deleitava, nas tripas ela se deliciava, destruindo e corrompendo aqueles corpos que outrora foram puros. Eu não podia entender como a cobra comia até mesmo os ossos, não sobrava restos de cadáveres!
Percebi que a selva era corpo da cobra, ali os garotos mortos ficavam para sempre, consumidos pelos desejos, pelos pecados, pelos prazeres, que somente o Diabo poderia proporcionar, decidi então, ir para longe da selva, lembrei das palavras de meu pai, mas mesmo assim, sinto que não posso viver! A vida se consumiu em blasé,em tédio, quanta saudade eu sinto. Maldita e bendita seja a cobra!